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Criação de Conteúdo com um Olhar Feminista

Foto do escritor: Bluma HubBluma Hub

Atualizado: 28 de nov. de 2023

A importância de dar voz às mulheres na produção de conteúdo, de forma a tornar a comunicação mais inclusiva

em segundo plano com desfoque vemos uma mulher negra em frente a uma parede azul gravando um video em um celular que aparece em foco no primeiro plano da imagem

A relevância dos estudos sobre as questões de gênero na comunicação é algo que vem sendo reafirmado por estudiosos, comunicadores e membros da sociedade como um todo. Apesar de todos os avanços e conquistas atingidos, a desigualdade entre homens e mulheres ainda existe e pode ser testemunhada também em conteúdos produzidos para os meios de comunicação.


Sabendo que ainda temos muito trabalho pela frente e sendo uma empresa formada por mulheres consideramos essa pauta muito importante!


Pensando nessas questões, conversamos com a Luíza Buzzacaro, jornalista, Mestre em Ciências da Comunicação. Luiza estuda, desde a graduação, a intersecção entre gênero e jornalismo e trouxe para a gente muitas informações sobre esse tema.


Qual a importância do olhar feminista na criação de conteúdo?


Luíza Buzzacaro: Como uma pessoa que tenta enxergar gênero em todas as coisas do mundo (o que é que o conceito de gênero enquanto categoria teórico-epistemológica nos propõe) eu acho crucial termos esse olhar feminista no nosso dia a dia, desde as nossas relações até os materiais que produzimos. Eu sou jornalista e pesquisei sobre essas questões de gênero no jornalismo, então eu acho que a importância desse olhar feminista na produção de conteúdo se dá em duas principais searas: nas relações que se formam, enquanto equipe, pra que aquele conteúdo seja produzido, e nas palavras que a gente escolhe pra descrever/veicular tal conteúdo. A Márcia Tiburi (2018, p. 75) fala, no livro Feminismo em Comum, que é papel do feminismo “se preocupar com as palavras por meio das quais as pessoas sempre foram controladas, cerceadas e dominadas” e eu acho que a grande importância de termos essa virada de chave no olhar ta aí. A palavra - seja ela dita em voz alta ou apenas escrita - tem um poder simbólico gigangesteco em relação às coisas que a gente vai consumindo, ao longo da vida, e aquilo que a gente vai acreditando que é o padrão, que é o certo, que é o único caminho possível, que é o “normal”. De forma mais ou menos consciente somos moldados socialmente e culturalmente por esses produtos que consumimos. E com as redes sociais, com o mundo digital, não apenas consumimos como somos também bombardeados com informações e conteúdos de diferentes frentes. Então, por exemplo, se tu consome um tipo de conteúdo que te induz a pensar que a principal função da mulher é cuidar do lar, do marido e dos filhos (e por mais inacreditável que pareça, eu tenho visto muito esse tipo de conteúdo, vindo de mulheres, rolando nas redes sociais) a gente vai absorvendo aquilo, pensando inicialmente “que absurdo”, mas daqui a pouco até eu, que sou uma mulher feminista, tô me perguntando “será que isso faz sentido?”. A palavra induz a uma reflexão, a uma interpretação do mundo, de uma realidade, então eu acho que a criação de conteúdo precisa se preocupar muito com a mensagem (verbal e visual) que quer passar e os efeitos que isso pode gerar no público que consome.


“Pra mim a importância do olhar feminista tá aí, ter esse cuidado pra não transformar diferenças em desigualdades e estereótipos em regras comportamentais a serem seguidas”.


Na sua opinião, como é possível incentivar o feminismo e as questões de gênero na rotina da produção de conteúdo das empresas?


Luíza Buzzacaro: Eu acho que o feminismo e esse olhar de gênero pode iniciar nos pequenos passos. Eu acho que a mínima movimentação que uma pessoa faz em direção a mudança, a quebra de um paradigma profissional estabelecido, já consegue ir influindo, a longo prazo, em uma mudança coletiva. Não é do dia pra noite que a gente consegue virar a chave e transformar uma realidade - seria ótimo, mas não funciona assim. Eu acho que esse incentivo na rotina das empresas perpassa muito o que eu falei no meu curso de Jornalismo Feminista e que considera 4 principais premissas:


1. Não existem caixinhas: As experiências não são universais, por isso não faz sentido tentar encaixar as pessoas dentro de estereótipos pré determinados. Isso quer dizer que cada empresa tem um processo de produção, um fluxo, uma equipe com pessoas completamente diferentes umas das outras, inclusive na forma de trabalhar. E isso já puxa o segundo tópico…


2. Não existe receita de bolo: Não tem como aplicar um manual de como fazer (o feminismo luta, justamente, para que as pessoas tenham a liberdade de ser quem são e fazer o que querem, então criar um padrão infalível de feminismo nem combina com o movimento). Cada história, cada pessoa, cada pauta, cada conteúdo vai encontrar sua forma de narrar/ser narrado.


3. As subjetividades entram em jogo: Cada experiência é subjetiva e cada subjetividade em relação com outras subjetividades vai gerar uma narrativa diferente. Isso quer dizer que tudo o que a gente produz possui posicionamento (mesmo que inconsciente, o posicionamento existe). Então é preciso olhar pra tudo o que a gente produz com esse olhar crítico sobre si e sobre seus próprios valores e subjetividades que entram ali, em conflito, na hora da produção do conteúdo.


4. O exercício é simples, a mudança é complexa: Não conseguimos virar a chave de uma hora pra outra. O mais importante é começar com pequenos passos. Ter isso em mente torna a tarefa de sermos pessoas mais inclusivas e afeitas a alteridade (valores tão caros ao feminismo) algo mais leve e efetivo.


Dito isso, acho que existem as seguintes provocações que podem ser feitas antes, durante e após um processo de produção de conteúdo:


a) Definição da pauta: na hora de pensar em um conteúdo, se questione “A quem esse conteúdo interessa? Qual o seu objetivo? Por que ele interessa a essa marca/organização? Existe algum ponto de vista que eu possa estar desconsiderando? Será que existe algum outro viés envolvido que eu não consiga enxergar sozinha?”


b) Horizontalidade: as primeiras reflexões levam a um segundo ponto “por que não chamar outras pessoas da equipe para participarem do meu processo criativo e proporem ideias, motes, desdobramentos?”. Ter a construção desse saber coletivo, feito por muitas mãos, ouvindo diferentes opiniões de forma horizontal (ou seja, dando o mesmo peso para as opiniões desde o estagiário até o CEO) faz com que ele seja mais inclusivo e diverso, portanto, mais feminista.


c) Protagonismo das vozes/histórias: conteúdos com dados, infográficos e big numbers são muito legais, mas às vezes acabam esvaziando as discussões e pautas trabalhadas.

Procure ouvir histórias e publicar sobre elas, dando voz, sobretudo, para experiências de pessoas que normalmente não têm um espaço privilegiado nos espaços comunicacionais, como mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTQIA+ e pessoas com algum tipo de deficiência.

O que homens, brancos, de classe alta e heterossexuais (pertencentes a um padrão heteronormativo hegemônico) têm a dizer nós já sabemos, ficamos escutando o que eles tinham a dizer durante séculos. Agora é hora de dar espaço para as vozes das pessoas que foram subalternizadas durante todo esse tempo.



Nas redes sociais ainda há, infelizmente, muitos conteúdos extremistas e fake news, muitos deles relacionados a questões de gênero, inclusive. Você acredita que a PL 2630/2020 pode ser uma forma de frear conteúdos que denotem preconceito de gênero?


Luíza Buzzacaro: Esse projeto de lei é um pouco polêmico e controverso, acho que há muitos pontos para refletirmos e questionarmos, ele pode, sim, ajudar a frear a disseminação de conteúdos que gerem desinformação nas redes sociais, com o banimento de contas abastecidas por bots, mas eu não acho que o PL, em si, vai frear a produção dessas fake news (de gênero e todas as outras). A gente está passando por um momento de transição, foram 4 anos de um governo extremista que legitimava um discurso de ódio e que incentivava a produção e disseminação dessas fake news que favoreciam ele e sua própria família. Esse movimento ganhou força porque era legitimado por um presidente da república. Isso fez com que as pessoas deixassem vir à tona seus preconceitos mais profundos e bárbaros. É como se isso desse o direito às pessoas que concordam com esses pensamentos fascistas voltar no tempo, esquecer/ignorar o tanto de coisa que já evoluímos enquanto seres humanos. Então eu acho que o buraco é mais embaixo, não é essa regulamentação que vai resolver o problema, ela vai só mascarar um fenômeno que ganhou força nos últimos anos - e que continua fazendo parte da vivência de grande parte da população, sobretudo a brasileira. Agora existe um ponto positivo, também, toda vez que um projeto de lei é proposto, ele faz com que o assunto central do PL venha à tona, vá pro centro das discussões, no âmbito político, no âmbito dos veículos de comunicação e, consequentemente, no âmbito privado e doméstico dos cidadãos. Para discutir sobre determinado tema é preciso refletir sobre ele - e eu acho que, sinceramente, o que de fato gera mudança é a reflexão e a postura que cada pessoa vai ter, individualmente. É aquilo que eu disse antes, cada um muda um pouco e, juntos, enquanto sociedade, evoluímos muito.


Se você pudesse indicar alguns perfis ou autoras que atuam em prol do feminismo para que as pessoas sigam e acompanhem, quais você indicaria?


Luíza Buzzacaro: Primeiramente indicaria o meu perfil, @porumjornalismofeminista, porque enquanto jornalista, pesquisadora e produtora de conteúdo pra redes sociais, acho que a gente pode pensar juntas nas coisas que compartilho ali - e porque é um canal que eu criei que é super aberto pra qualquer troca de ideia.


Mas também tem alguns outros que vale acompanhar:

Manuela Xavier @manuelaxavier - ela traz uma visão psicanalítica sobre as questões de gênero e é sempre muito polêmica e provocativa nas suas colocações. Não precisamos concordar com tudo o que ela publica, mas vale, ao menos, refletir sobre os pontos que traz.


Hana Khalil @khalilhana - é uma influenciadora de lifestyle, mas aproveita o seu alcance pra trazer reflexões sobre gênero de forma debochada e bem didática. Vale acompanhar também.


Débora Diniz @debora_d_diniz - é uma professora, tem conteúdos mais teóricos e conceituais, mas também é super didática e costuma comentar/fazer resenhas sobre assuntos/notícias que tão circulando na mídia e que falam sobre gênero.


✅Obvius @obvius.cc - produz diferentes conteúdos, com diferentes viéses, e tem uma gama bem grande de formatos de conteúdo, mas acho que aqui a Marcela Ceribelli (criadora da Obvius) consegue trazer um recorte bem presente na vida das mulheres jovens: a exaustão das feministas cansadas. É um perfil que gera mais identificação do que reflexão, mas acho que vale acompanhar, nem que seja pra percebemos que não estamos sozinhas.


Acho que esses são os perfis que eu mais acompanho e indico o conteúdo nas redes sociais - são, talvez, os perfis com os quais eu mais me identifico, devido ao meu lugar de fala. Importante frisar isso! Existem outras milhões de mulheres para acompanhar - e garanto que várias delas produzem conteúdos feministas importantes considerando outros recortes (de raça, classe, LGBT, etc.)


Que outras dicas você dá para criadores de conteúdo que desejam nortear sua produção por esse olhar feminista?


Luíza Buzzacaro: Escutar mulheres, conversar com mulheres, ler mulheres, ouvir artistas mulheres, ver filmes produzidos por mulheres e, no dia a dia, adotar uma postura empática, compreensiva e vulnerável… acho que esse já é um bom começo!


Luíza Buzzacaro é jornalista formada pela ESPM-Sul e Mestre em Ciências da Comunicação pela Unisinos. Estuda, desde a graduação, a intersecção entre gênero e jornalismo, sobretudo na cobertura midiática sobre violência de gênero. Foi membro do LIC (Laboratório do Ciberacontecimento), grupo de pesquisa do PPGCC Unisinos e integrante do projeto de pesquisa “Violência de Gênero contra Mulheres e LGBTs: monitoramento de dados jornalísticos para ampliação do conhecimento?”, financiado pela FAPERGS. Foi bolsista de Apoio Técnico a Pesquisa pelo CNPq, dentro do PPGCC Unisinos.Atualmente é Analista de Redes Sociais na +A Educação e Consultora de marketing digital no Instituto de Cultura Digital, da Unisinos.


E você que trabalha com conteúdo, já refletiu sobre essas questões de igualdade de gênero na sua produção? Tem dicas de perfis interessantes sobre o tema? Deixa aqui para a gente nos comentarios.


Esperamos que você tenha gostado!


Um abraço e até a próxima \o/


Equipe Bluma

@blumahub | contato@blumahub.com.br



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